25 de abril de 2009






Abril de Abril



Era um Abril de amigo Abril de trigo
Abril de trevo e trégua e vinho e húmus
Abril de novos ritmos novos rumos.

Era um Abril comigo Abril contigo
ainda só ardor e sem ardil
Abril sem adjectivo Abril de Abril.

Era um Abril na praça Abril de massas
era um Abril na rua Abril a rodos
Abril de sol que nasce para todos.

Abril de vinho e sonho em nossas taças
era um Abril de clava Abril em acto
em mil novecentos e setenta e quatro.

Era um Abril viril Abril tão bravo
Abril de boca a abrir-se Abril palavra
esse Abril em que Abril se libertava.

Era um Abril de clava Abril de cravo
Abril de mão na mão e sem fantasmas
esse Abril em que Abril floriu nas armas.

Manuel Alegre

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18 de abril de 2009




Nocturno

Espírito que passas, quando o vento
Adormece no mar e surge a Lua,
Filho esquivo da noite que flutua,
Tu só entendes bem o meu tormento...
-
Como um canto longínquo – triste e lento –
Que voga e subtilmente se insinua,
Sobre o meu coração, que tumultua,
Tu vertes pouco a pouco o esquecimento...
-
A ti confio o sonho em que me leva
Um instinto de luz, rompendo a treva,
Buscando, entre visões, o eterno Bem.
-
E tu entendes o meu mal sem nome,
A febre de Ideal, que me consome,
Tu só, Génio da Noite, e mais ninguém!

Antero de Quental,
Sonetos
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17 de abril de 2009



I had a farm in Africa at the foot of the Ngong Hills. The Equator runs across these highlands, a hundred miles to the North, and the farm lay at an altitude of over six thousand feet. In the day-time you felt that you had got high up, near to the sun, but the early mornings and evenings were limpid and restful, and the nights were cold. (…)
The chief feature of the landscape, and of your life in it, was the air. Looking back on a sojourn in the African highlands, you are struck by your feeling of having lived for a time up in the air. (…) Up in this air you breathed easily, drawing in a vital assurance and lightness of heart. In the highlands you woke up in the morning and thought: Here I am, where I ought to be.

Karen Blixen, Out of Africa

16 de abril de 2009






How I Became Charming, Likeable and Delightful



I sleep very late. I commit suicide at 65%. My life is very cheap, it's
only 30% of life for me. My life has 30% of life. It lacks arms,
strings and a few buttons. 5% is devoted to a state of semi-lucid
stupor accompanied by anaemic crackling. This 5% is called
DADA. So life is cheap. Death is a bit more expensive. But life is
charming and death is equally charming.
A few days ago I was at a meeting of imbeciles. There were a lot of
people there. Everyone was charming. Tristan Tzara, a small,
absurd and insignificant individual was giving a lecture on the art of
becoming charming. He was charming, at that. Everyone is
charming. And witty. It's delightful, isn't it? Everyone is delightful,
at that. 9 degrees below zero. It's charming, isn't it? No, it isn't
charming. God isn't up to it. He isn't even in the directory. But
even so he's charming.
Ambassadors, poets, counts, princes, musicians, journalists, actors,
writers, diplomats, directors, dressmakers, socialists, princesses
and baronesses are charming.
You're all of you charming, very subtle, witty and delightful.
Tristan Tzara says to you: he's quite willing to do something else,
but he prefers to remain an idiot, a practical joker and a hoaxer. Be
sincere for a moment: what I've just said to you - is it charming
or idiotic?



Tristan Tzara
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11 de abril de 2009




Coming To This




We have done what we wanted.
We have discarded dreams, preferring the heavy industry
of each other, and we have welcomed grief
and called ruin the impossible habit to break.


And now we are here.
The dinner is ready and we cannot eat.
The meat sits in the white lake of its dish.
The wine waits.


Coming to this
has its rewards: nothing is promised, nothing is taken away.
We have no heart or saving grace,
no place to go, no reason to remain.



Mark Strand



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8 de abril de 2009



J'aimais

J'aimais les fées et les princesses
Qu'on me disait n'exister pas
J'aimais le feu et la tendresse
Tu vois je vous rêvais déjà

J'aimais les tours hautes et larges
Pour voir au large venir l'amour
J'aimais les tours de cœur de garde
Tu vois je vous guettais déjà

J'aimais le col ondoyant des vagues
Les saules nobles languissant vers moi
J'aimais la ligne tournante des algues
Tu vois je vous savais déjà

J'aimais courir jusqu'à tomber
J'aimais la nuit jusqu'au matin
Je n'aimais rien non j'ai adoré
Tu vois je vous aimais déjà

J'aimais l'été pour ses orages
Et pour la foudre sur le toit
J'aimais l'éclair sur ton visage
Tu vois je vous brûlais déjà

J'aimais la pluie noyant l'espace
Au long des brumes du pays plat
J'aimais la brume que le vent chasse
Tu vois je vous pleurais déjà

J'aimais la vigne et le houblon
Les villes du Nord les laides de nuit
Les fleuves profonds m'appelant au lit
Tu vois je vous oubliais déjà


Jacques Brel

7 de abril de 2009



Ele — Bom-dia.
Ela (Bastante depois.) — Bom-dia.
(Sorri-se.)
Ele — Faz-me o favor. Sabe dizer-me o nome deste sítio?
Ela — Aqui não é sítio nenhum.
Ele — É a primeira vez que estou em sítio nenhum.
Ela — Para onde é que o senhor deseja ir?
Ele — Para sítio nenhum. Vou de passeio. Ao acaso. Gosto de saber os nomes por onde ando.
Ela — Aqui não tem nenhum nome.
Ele (Olhando a cena.) — Uma casa. Não se faz uma casa em sítio nenhum.
Ela — Isto esteve para ser um sítio com um nome. O senhor viu aqui uma casa. Chama a isto uma casa?
Ele — Os restos de uma casa.
Ela — Nem isso. Também não. Não chegou a ser uma casa. Ficou a meio.
Ele — Não passou das paredes.
Ela — Ficou parada à nascença. Para sempre.
Ele — Não parece obra recente.
Ela — Nem antiga. O que é velho parece antigo. Mas o antigo não envelhece.

Ele — Esta ficou no começo e envelheceu.
Ela — Envelheceu parada de nascença.
Ele — Ruínas do que não se fez.
Ela — Bastante modernas.
Ele — Por qualquer razão não foi adiante.
Ela — Não foi. Não foi uma casa.



Almada Negreiros, Deseja-se Mulher (excerto)

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5 de abril de 2009


AMIZADE


De mais ninguém senão de ti, preciso:
Do teu sereno olhar, do teu sorriso,
Da tua mão pousada no meu ombro.
Ouvir-te murmurar: - "Espera e confia!"
E sentir converter-se em harmonia,
O que era, dantes, confusão e assombro.


Carlos Queirós
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