Às vezes, encontro-me nas palavras dos outros. Mais raramente, nas minhas. Por pura coincidência. Em pura coincidência.
29 de junho de 2006
Vasko Popa (1922-1991)
Give Me Back My Rags #4
Get out of my walled infinity
Of the star circle round my heart
Of my mouthful of sun
Get out of the comic sea of my blood
Of my flow of my ebb
Get out of my stranded silence
Get out I said get out
Get out of my living abyss
Of the bare father-tree within me
Get out how long must I cry get out
Get out of my bursting head
Get out just get out
Vasko Popa
Tradução inglesa de Anne Pennington)
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27 de junho de 2006
Frank O'Hara (1926-1966)
As Planned
After the first glass of vodka
you can accept just about anything
of life even your own mysteriousness
you think it is nice that a box
of matches is purple and brown and is called
La Petite and comes from Sweden
for they are words that you know and that
is all you know words not their feelings
or what they mean and you write because
you know them not because you understand them
because you don't you are stupid and lazy
and will never be great but you do
what you know because what else is there?
Frank O'Hara
25 de junho de 2006
Ingeborg Bachmann (1926-1973)
A GRANDE CARGA
Foi embarcada a grande carga do Verão,
pronto a zarpar, no cais, está o barco do sol,
quando a gaivota cai e te grita o sinal.
Foi embarcada a grande carga do Verão.
Pronto a zarpar, no cais, está o barco do sol,
e à proa, sobre os lábios das figuras,
abre-se o ominoso riso dos lemures.
Pronto a zarpar, no cais, está o barco do sol.
Quando a gaivota cai e te grita o sinal,
então vem do poente a ordem de afundar;
mas é de olhos na luz que te vais afogar,
quando a gaivota cai e te grita o sinal.
Ingeborg Bachmann
(Tradução de João Barrento e Judite Berkemeyer)
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24 de junho de 2006
Eloy Sanchez Rosillo (1948)
Principio y fin
Puede ser que te digas: "El verano que viene
quiero volver a Italia", o: "El año que hoy empieza
tengo que aprovecharlo; con un poco de suerte
acabaré mi libro", y también: "Cuando crezca
mi hijo, ¿qué haré yo sin el don de su infancia?".
Pero el verano próximo, en verdad, ya ha pasado;
terminaste hace muchos años el libro aquel
en el que ahora trabajas; tu hijo se hizo un hombre
y siguió su camino, lejos de ti. Los días
que vendrán ya vinieron. Y luego cae la noche.
A la vez respiramos la luz y la ceniza.
Principio y fin habitan en el mismo relámpago.
Eloy Sanchez Rosillo
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17 de junho de 2006
António Franco Alexandre (1944)
deixo acesa, mas muda, a tv que derrama
uma luz submarina sobre a cama desfeita,
o corpo imaginado em que dormi.
Toda a noite esperei que me chamasse
a pancada das mãos numa mesa de galo,
ou do baralho gasto me saísse,
na lotaria universal, essa palavra incerta
quase a rimar contigo; e já
me esgueiro pelas frinchas da janela,
disperso na manhã leve e tranquila
como uma sombra mais incandescente.
Fora, a piscina do mar está lisa e fina
e apetece subir, pelas colunas de ar, ao céu
do deus desengonçado, ameaçá-lo
com a ignorância humana, a indiferença, a morte,
as coisas que não sabe nem pressente:
como um vampiro se não vê ao espelho,
como lobos vulgares são gente humana,
como os devora a imagem nunca vista,
como sempre se enganam a caminho
de um vago coração adormecido.
António Franco Alexandre
13 de junho de 2006
Fernando Pessoa (1888-1935)
Quero ser livre insincero
Sem crença, dever ou posto.
Prisões, nem de amor as quero.
Não me amem, porque não gosto.
Quando canto o que não minto
E choro o que sucedeu,
É que esqueci o que sinto
E que julgo que não sou eu.
De mim mesmo viandante
Olho as músicas na aragem,
E a minha mesma alma errante
É uma canção de viagem.
Fernando Pessoa
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11 de junho de 2006
Anna Akhmátova (1889-1966)
Lot's Wife
The just man followed then his angel guide
Where he strode on the black highway, hulking and bright;
But a wild grief in his wife's bosom cried,
Look back, it is not too late for a last sight
Of the red towers of your native Sodom, the square
Where once you sang, the gardens you shall mourn,
And the tall house with empty windows where
You loved your husband and your babes were born.
She turned, and looking on the bitter view
Her eyes were welded shut by mortal pain;
Into transparent salt her body grew,
And her quick feet were rooted in the plain.
Who would waste tears upon her? Is she not
The least of our losses, this unhappy wife?
Yet in my heart she will not be forgot
Who, for a single glance, gave up her life.
Anna Akhmátova
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