4 de dezembro de 2005


Rainer Maria Rilke (1875-1926)


CANÇÃO

Tu, a quem não digo que acordado
fico à noite a chorar;
tu, cujo ser me faz cansado
como um berço a embalar;
tu, que me não dizes quando velas
por amor de mim;
diz-me: — Se pudéssemos aguentar
sem a acalmar
a pompa deste amor até ao fim?

...............................................................

Ora olha os amantes e o que eles sentem:
mal vêm as confissões,
quão breve mentem!

..............................................................

Só tu me fazes só. Só tu posso trocar.
Um momento és bem tu, depois é o sussurrar
ou um perfume sem traços.
Ai! a todas eu perdi entre os meus braços!
Só tu em mim renasces, sempre e a toda a hora:
Por nunca te abraçar é que te tenho agora.

Rainer Maria Rilke



1 comentário:

Graça disse...

Transcreve-se a seguir a versão francesa do próprio Rilke para a edição de Les Cahiers de Laurids Brigge (1926):


Chanson


Toi, à qui je ne confie pas
mes longues nuits sans repos,
Toi qui me rends si tendrement las,
me berçant comme un berceau;
Toi qui me caches tes insomnies,
dis, si nous supportions
cette soif qui nous magnifie,
sans abandon?

..................................

Car rappelle-toi les amants,
comme le mensonge les surprend
à l'heure des confessions.

..................................

Toi seule, tu fais partie de ma solitude pure.
Tu te transformes en tout: tu es ce murmure
ou ce parfum aérien.
Entre mes bras: quel abîme qui s'abreuve de pertes.
Ils ne t'ont point retenue, et c'est grâce à cela, certes,
qu'à jamais je te tiens.